“Contigo falo, leitor desapaixonado, que, se o não és, não falo contigo, pois nem quero adulação dos amigos, porque o são, nem é justo que os que o não são queiram ser árbitros para sentenciar e nestas Obras no tribunal da sua crítica. Não há melhor ouvinte que um desapaixonado, sem afeto ao autor da obra, sem inclinação ao da música, sem conhecimento do arquiteto da Pintura. Aquele que nem a amizade lhe franqueia a entrada, nem a vizinhança do Teatro lhe facilita o regresso; aquele que instigado só da curiosidade, a expensas do seu pecúlio entra com ânimo livre de paixões, este, sim, não sendo estulto por natureza, é o verdadeiro ouvinte no teatro e leitor nos papéis. Com estes é que eu falo, pois só a estes se dirigem estas Obras; porque, sendo a sua censura despida de afetos de amor e ódio, saberá desculpar os erros com sinceridade...
.. só tu, leitor douto e desapaixonado, judiciosamente refletindo no que leres e ouvires representar, formarás o conceito que merecem estas Obras, que para teu divertimento se oferecem ao público...
DÉCIMAS
Amigo leitor, prudente,
Não crítico rigoroso,
Te desejo, mas piedoso
Os meus defeitos consente:
Nome não busco excelente,
Insigne entre os escritores;
Os aplausos inferiores
Julgo a meu plectro bastantes;
Os encômios relevantes
São para engenhos maiores.
Esta cômica harmonia
Passatempo é douto e grave;
Honesta, alegre e suave,
Divertida a melodia.
Apolo, que ilustra o dia,
Soberano me reparte
Ideas, facúndia e arte,
Leitor, para divertir-te,
Vontade para servir-te,
Afecto para agradar-te.
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