Se todo o ponto de vista é a vista de um ponto, Leonardo Boff conseguiu como ninguém extrair de uma história, que vem da África, metáfora para atingir três pontos sensíveis da condição humana:
- as mulheres
- aos que, embora sendo águias, se submetem ao estágio galinha
- ao povo negro e indígena, os quais carregam dentro de si desejo imenso de serem águia.
Valendo-se do personagem James Aggrey, político e educador, natural de Gana, o autor nos faz compreender que nossa ação é a responsável pela nossa libertação. Liberdade esta que se dá início em nossa própria consciência. Que ler nos leva a reler, o que, por sua vez, nos faz compreender e interpretar, uma vez que cada qual lê de acordo com a compreensão que tem de espaço e lugar.
Assim, a história é contada sob várias formas, mostrando que na abordagem de um tema, é possível obter-se várias interpretações.
A fantástica leitura leva, portanto, a outras releituras. Alguns despertarão a águia adormecida na galinha. Outros continuarão na condição galinha. Muitos morrerão por não poderem soltar a águia aprisionada dentro de si.
Dessa forma, o leitor é convidado a se tornar um co-autor, num mundo criado e por ser criado.
Sob a ótica do tema central, a metáfora de duas aves que, apresentando símbolos diferentes, um o enraizamento, o pé no chão, o concreto – a galinha - outro, o ilimitado, o sonho a ser conquistado, o poético – a águia – o autor nos introduz às diversas áreas do saber humano: a história, a psicologia, a ecologia, a antropologia, a filosofia, a espiritualidade, a mística.
Através da história, leva-nos a conhecer um povo despojado de apegos materiais, detentor de forte traço de ancestralidade e uma rica cultura em usos e costumes e que, sobretudo, nascera livre.
Transporta-nos, então até a África, mais precisamente a Gana. Abastada pelos seus recursos naturais, o ouro, o qual despertaria cobiça perante os povos dominadores do século XVI que, não entendendo as diferenças de raça, religião e cultura como legado humano, logo tornariam essas características marcos de inferioridade, oprimindo e tornando cativos, aqueles que livres nasceram.
Ademais, o educador James Aggrey, quando este, em meados de 1925, numa reunião de lideranças em que a baila está à proposição a libertação de Gana do jugo inglês, calmamente tomado da palavra começa a narrar a lendária história representada pela águia e a galinha, para provar que libertando a liberdade cativa, pode a auto estima ser resgatada; que essa libertação começa na consciência de cada pessoa e, mesmo que a libertação do país tenha ocorrido somente em
Todavia, como todo ponto de vista é a vista de um ponto, segundo nos exorta o autor Leonardo Boff, a leitura terá significados vários, sob a ótica do leitor e seus objetivos.
O próprio autor nos propõe várias leituras dentro de uma leitura, e leva o leitor a ser co-autor de uma obra a ser criada, a ser recontada, reinventada, além de poder questionar sua própria identidade.
Leonardo Boff, professor e teólogo, logo instiga o leitor à possibilidade da proposta de se contar uma história sob várias formas, levando-o a questionar e explorar o vasto universo da leitura, quando aponta que os livros têm seu próprio destino e que, este, está ligado ao destino do leitor que, através do seu olhar, é possível haver várias leituras e várias interpretações, de acordo com a realidade de cada um, seu espaço, seu universo, seu mundo.
Aqui podemos abrir um parêntese e, em paralelo adentrar as cinco leis da biblioteconomia, formuladas por Shiarley Ranganatan, matemático e bibliotecário hindu, nos idos de 1928, quando nos diz que a cada livro seu leitor e a cada leitor o seu livro.
Podemos perceber que essas duas leis estariam enquadradas ao destino do livro, onde cada leitor pode ler, compreender, interpretar e até mesmo ser co-autor da criação literária, por meio da vista que o ponto alcança. Que, através da leitura o leitor pode ser partícipe de transformações sociais e culturais, recontando histórias, sendo a própria história. Que as mudanças ocorrem de dentro para fora; que à medida que se adentra o universo do conhecimento, subsídios vão sendo agregados ao cidadão para que este se aparte do trivial e comum para, enfim, poder contribuir com a sociedade em constante mutação.
Aquele cidadão que rompe barreiras quebra grilhões, ultrapassa fronteiras, torna-se livre, alça vôos como águia, rumo aos ideais dos sonhos avassaladores e, sabiamente mescla o concreto, a galinha, aos projetos pré-definidos, onde o objetivo maior sempre será o encontro com a felicidade, somente possível através do equilíbrio entre o imaginário (águia) e o real (galinha).
Percebe-se, então, o ilimitado universo da leitura e, se não há limite para se fazer livros, conforme nos exorta Eclesiastes e se, livros nos tornam livres, vamos usar e abusar da palavra; vamos criar, inovar, reinventar uma nova história.
Agora, se ao educador (James Aggrey) coube resgatar a águia aprisionada de um povo. Ao escritor (Leonardo Boff) dedicar a obra aos mais desfavorecidos da sociedade, aos mais sensíveis, as mulheres, vitimadas pela opressão, repressão e descaso, numa cultura em que o machismo prevalece; àqueles que, embora carreguem dentro de si o espectro de águia, por motivos adversos tem de se portar como galinhas e, mais ainda, aos negros e índios que, sem dúvida, anseiam em ser águia.
A esta leitora que escreve restou a incumbência de ser co-autora, deixando-se envolver como águia e subir o mais alto que sua vista pode alcançar e deu asas a imaginação. Também pode ver seus pés fincados ao chão e marcar sua presença no universo literário, através da contribuição escrita que o ponto lhe pode levar, pois percebeu que, se todo ponto de vista é a vista de um ponto, com certeza a vista sempre poderá alcançar tantos pontos quanto seu olhar vislumbrar.
Resenhado por Inajá Martins de Almeida
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- as mulheres
- aos que, embora sendo águias, se submetem ao estágio galinha
- ao povo negro e indígena, os quais carregam dentro de si desejo imenso de serem águia.
Assim, a história é contada sob várias formas, mostrando que na abordagem de um tema, é possível obter-se várias interpretações.
A fantástica leitura leva, portanto, a outras releituras. Alguns despertarão a águia adormecida na galinha. Outros continuarão na condição galinha. Muitos morrerão por não poderem soltar a águia aprisionada dentro de si.
Dessa forma, o leitor é convidado a se tornar um co-autor, num mundo criado e por ser criado.
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