Giuseppe Tomasi di Lampedusa, autor siciliano, nascido em Palermo em 1896, em sua obra, Os Contos, chama-me atenção especial quando diz ser imprescindível que nossas memórias sejam registradas.
A partir desse momento, torno minhas suas palavras, e passo a perceber e dar importância maior aos fatos cotidianos, que muitas vezes fortuitos foram ao meu olhar. Passo então almejar o registro das cenas presentes com mais assiduidade. Tento resgatar o passado que, gradativamente, vem falar de mim.
Percorrendo locais de sua infância, lugares, a casa natal, por ele desenhada, busca levar o leitor a um cenário bucólico. A aristocracia em que nascera, a qual lhe outorgara o título de conde, já não lhe era mais permitida, posto perdas várias, mas o registro é marcado por uma narrativa contagiante, que nos remete a uma época e lugar não desconhecidos de nós – a velha Europa.
Quantos não percorreram vales e montanhas, rios e desertos áridos em suas vidas. A diferença é que uns deixaram registros outros não. Penso até que Lampedusa estivesse num momento de pura amargura ao escrever as palavras iniciais, com uma frase forte : “ao encontrarmo-nos no declínio da vida”. Talvez até estivesse em sua fase derradeira; penso sim que o declínio não seja o término de sua existência, posto que vem a falecer em 1957 e o livro fora escrito muito antes.
Bem, este é o leitor. Quer adentrar as entrelinhas, os pensamentos do próprio autor. Triste ou não, amargurado pelas adversidades, ou quem sabe... lega-nos uma máxima de uma veracidade inigualável.
Também imagino o quão benéfico seriam nossas memórias escritas, para que gerações futuras, aquelas que não puderam nos ver, nos conhecer pessoalmente, pudessem saber de nós através das linhas: “o material acumulado... teria valor inestimável”.
Assim, é que a partir daquele momento, daquela leitura, minha vida jamais fora a mesma.
"Ao encontrarmo-nos no declínio da vida , é preciso procurar reunir a maior parte das sensações que perpassaram esse nosso organismo. Poucos conseguirão construir assim uma obra prima (Rousseau, Stendhall, Proust), mas todos deveriam poder preservar, desse modo, algo que sem esse pequeno esforço perderia-se para sempre. Manter um diário ou escrever, em certa idade, as próprias memórias deveria ser obrigação “imposta pelo estado”: o material acumulado após três ou quatro gerações teria valor inestimável. Resolveria muitos problemas psicológicos e históricos que afligem a humanidade. Não existe memória, embora escritas por personagens insignificantes, que não apresentem valores sociais e pitorescos de primeira ordem”. (Tomasi di Lampedusa - Os Contos)
comentários de Inajá Martins de Almeida
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Tomasi di Lampedusa, Giuseppe – Os contos / Giuseppe Tomasi di Lampedusa; tradução de Loredana de Stauber, ilustrações de Gustavo Rezende. Berlinds e Vertecchia Editores.
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