________________________
A estrada está deserta.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de lá muito se apagou.
Tudo deserto.
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.
Sozinha...
Errada a estrada.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.
Num bramido de dor.
Num espasmo de agonia
Ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.
Sozinha...
Na estrada deserta,
Sempre a procurar
o perdido tempo que ficou pra trás.
Do perdido tempo.
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:
Volta...Volta...Volta...
E os morros abriam para mim
Imensos braços vegetais.
E os sinos das igrejas
Que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...
E as rolinhas fogo-pagou
Das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
Chamava...chamava...
Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa deserta.
(Meu Livro de Cordel, p.84, 8°ed., 1998)
________________
A noite fria soube tão bem acalentar as almas ao encontro do chamado das pedras, desta vez não sendo atiradas, mas recolhidas, transformadas em sonhos.
Sonhos que pudemos sonhar num momento breve, quando Rita Elisa Sêda entoava o belíssimo poema de Cora Coralina.
E podíamos ouvir o soar dos sinos
e juntos entoávamos
vem... vem... vem...
e bebíamos ávidos as palavras:
volta... volta... volta...
e voltávamos ao passado
recolhendo retalhos de uma vida ímpar
que, algumas de nós mulheres, sonhamos viver e ser - Coras Coralinas.
_________________
Comentários de Inajá Martins de Almeida
fotos: Elvio Antunes de Arruda
Araraquara, 27 de maio de 2011